09 março 2015

Uvas brancas

Por 
CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA
Engenheiro     
Santo André - SP
carlos@sabbahi.com.br








UVAS BRANCAS
Às vezes renegadas, muitas vezes amadas; quase sempre a pedida certa em vinhos para o verão


Salut, les amis!
NA MINHA COLUNA DE JANEIRO deixei algumas dicas de vinhos ideais para o verão -  em sua grande maioria vinhos brancos, por tratarem-se de vinhos muitas vezes mais leves e ácidos - portanto, mais refrescantes. Abaixo o preconceito explícito muitas vezes naquela frase: “só bebo tintos”! Vamos continuar tratando desse assunto conhecendo um pouco mais das principais cepas brancas mais utilizadas ao redor do mundo.


Alvarinho
Manjadíssima uva branca dos Vinhos Verdes portugueses, (nos quais podem entrar também no corte a loureiro, a arinto e a trajadura) a alvarinho encontra sua maior expressão mesmo na Península Ibérica, na região fronteriça entre Portugal e Espanha. Galícia, Rias Baixas e Vinho Verde são suas principais denominações. Gera vinhos leves, frescos, elegantes e bem equilibrados, frequentemente com baixo teor alcoólico, com muito boa acidez, com aromas de damascos, frutas de carne branca (pêssego, pêra), cítricos e flores brancas. O Vinho Verde (o adjetivo é relativo à maturação, e não à cor do vinho...) é engarrafado muito cedo e muitas vezes libera um restinho da fermentação na própria garrafa, resultando em pequenas bolhas de gás, quase imperceptíveis a olho nu, mas que proporcionam uma leve sensação de efervescência na boca (a chamada “agulha”). No Dão alguns vinhateiros estão experimentando maturar o alvarinho em barricas de carvalho. Um ótimo exemplar português é o Soalheiro, produzido sem passar por madeira, na região do Melgaço. Um enólogo português – Miguel Ângelo Almeida – está conduzindo grandes projetos na Miolo, entre estes um belo alvarinho proveniente da região da Campanha Gaúcha.

Chardonnay (chardonê ou chardoné  - dependendo do sotaque francês)
Certamente a cepa branca mais difundida da face da Terra, esta uva dá origem a uma ampla gama de estilos de vinhos: de vinhos leves, cítricos e minerais, que não passam por barrica de carvalho (em geral de climas mais frios) a vinhos gordos, amanteigados, com aromas de frutas tropicais (manga, abacaxi), creme e baunilha, este último proveniente da criação em barrica de carvalho.  Talvez o ponto em comum sejam as nuances de frutas brancas como a maçã e a pêra. O supra-sumo do chardonnay é a região da Borgonha, na França, onde na sua região central (a Côte d’Or) gera vinhos desse segundo estilo, embora mais finos e elegantes que os provenientes de outros locais mais quentes (Chile, Austrália e Califórnia, por exemplo), e ao norte da Côte d’Or, na região de Chablis, resulta em vinhos minerais e cítricos devido ao solo calcário da região. Esta uva também é muito importante na produção do champagne, onde pode entrar em assemblage com a pinot meunier e a pinot noir, entre outras cepas regionais, ou mesmo gerar o champagne “blanc de blancs”, ou seja, só de uvas brancas. Opções de boa relação qualidade/preço são os vinhos do sul da Borgonha, das regiões do Mâconnais e da Côte Chalonnaise, bem como os bons produtores chilenos e argentinos, ainda mais acessíveis aqui no Brasil. Particularmente, sempre que pude beberiquei um Meursault, village da Borgonha que produz um vinho rico, amanteigado e com aromas de mel, amêndoas e nozes, ou um bom Chablis. Na América do Sul gosto do estilo mais seco e mineral da De Martino no Chile e os argentinos mais untuosos e amadeirados de Catena Zapata e Luigi Bosca.

Chenin Blanc (chenã blã)
Também originária da França, da região central do vale do Loire, onde dá à vida vinhos com ricos aromas de mel, maçã, goiaba branca e marmelo, além da característica mineral dos solos de tuffeau (uma espécie de calcário macio, micáceo e arenoso) ao longo do Loire, principalmente em torno de Vouvray, Savennières e Saumur, principais vilarejos produtores dessa uva, de onde provém vinhos espumantes, secos, meio-doces ou doces, estes últimos quando as uvas são atacadas pela “podridão nobre”, um fungo chamado botrytis cinerea  que desidrata os bagos concentrando o açúcar na fruta – tem aromas de pêssego e abacaxi em calda, açúcar mascavo e marmelo. Bonnezeaux e Quarts de Chaume são essencialmente denominações de vinhos doces. Sinceramente prefiro os vinhos secos da região – são mais finos e elegantes. Savennières produz grandíssimos vinhos brancos de guarda, entre eles o Coulée de Serrant, tido como um dos melhores do mundo; Clos de La Bergerie é o segundo vinho” de Nicolas Joly, proprietário do Coulée de Serrant e um dos baluartes da vinicultura biodinâmica – é mais acessível, mas ainda assim muito caro... Outro país que planta muita chenin é a África do Sul, onde os vinhos não expressam tanta complexidade, bem como na Austrália, Nova Zelândia, Califórnia ou Argentina. Encontramos no Brasil boas e acessíveis opções de tradicionais produtores do Loire, principalmente Vouvrays, que podem ser espumantes, secos e meio-secos.

Gewürztraminer (guevurstraminer)
Talvez seja a uva branca mais aromática, liberando insinuantes aromas de lichia e pétalas de rosa. Resulta em um vinho fragrante, untuoso e redondo na boca, que acompanha muito bem comidas mais condimentadas. Cai como uma luva com moqueca ou comida de acento tailandês ou chinês. É comum na região da fronteira da França com a Alemanha, na região da Alsácia, que já pertenceu aos dois países (normalmente os vilarejos dali tem um nome germânico até hoje). Também é plantada na Nova Zelândia e na Itália, onde é conhecida por Traminer e não gera vinhos tão luxuriantes como os alsacianos. Já provei um bom – e barato – vinho brasileiro desta cepa, da Casa Valduga. Dependendo da safra, a acidez pode cair e, na minha opinião,  o vinho se torna um pouco enjoativo. Tiro certo são os alsacianos.

Moscato
É assim conhecida na Itália, onde resulta no aromático e refrescante moscato d’Asti, na região noroeste. No Brasil, chamada de moscatel, também produz ótimos e descontraídos espumantes meio-doces. Uma das poucas – senão a única – cepa branca que tem o perfume de uva in natura, o que gerou inclusive o adjetivo muscaté, que os franceses utilizam para caracterizar um vinho com aroma de uvas. Conhecida com muscat, produz ricos vinhos doces com aromas de laranja cristalizada na Austrália, no sul da França (muscat de Beaumes-de-Venise, Frontignan e Rivesaltes) e na Espanha. Muscats secos são mais raros, produzidos principalmente na Alsácia, na Austrália e em Portugal. Moscatéis espumantes brasileiros são baratos, leves e refrescantes, os mais secos servem muito bem como aperitivo na beira da piscina e os mais doces acompanham sobremesas com cremes e frutas, como também vão muito bem com panetone. Já provei doces fortificados muito bons provenientes da Espanha (o Torres Floralis é muito rico, denso, com gosto de doce de laranja) e da França (o muscat de Baumes-de-Venise de Paul Jaboulet Ainé é um estilo de vinho mais equilibrado, ácido e leve que o espanhol).

Riesling (ríslin)
Não é todo enófilo principiante que se apaixona pela riesling à primeira vista – no princípio, o relacionamento é complicado... Às vezes, o bom vinho de riesling exala fortes aromas químicos de querosene, petróleo, fluido de isqueiro... pode parecer asqueroso, mas quando estes aromas se associam com equilíbrio aos aromas frutados de limão siciliano, lima, maçã, pêssegos e mel, ah! mes amis... é uma sensação inebriante! É a uva dos maiores vinhos alemães e aqui cabe um parêntese: a Alemanha produz grandíssimos vinhos, mas ficou marcada com a baixa qualidade dos liebfraumilch que exportava como louca nas décadas passadas – OK, muitos de nós começou bebendo vinho com as famigeradas garrafas azuis, então agora podemos provar bons rieslings! Na região do Mosela eles são mais leves e menos aromáticos que no Rheingau. Difícil mesmo é compreender os rótulos dos vinhos alemães, com suas inúmeras categorias de vinho. Os nomes costumam expressar o grau de maturação das uvas na colheita, o que nem sempre se traduz no vinho... A grosso modo, Trockenberrenauslese é o mais doce, produto da podridão nobre. Beerenauslese é doce, Auslese o médio, Spätlese e Kabinnet são os menos maduros. Quanto à doçura, Halbtrocken é meio seco e trocken, seco. A Alsácia e a Áustria produzem ótimos riesling, também encontrados na Nova Zelândia, África do Sul e Estados Unidos. É difícil encontrar um bom riesling, e barato. Da Alemanha já experimentei muito bons de Dr.Bürklin Wolf, Domdechant Werner, Kloster Heilsbruck e Pfaffmann; da Alsácia, Marcel Deiss, Hugel, Dopff & FiIls e Bott Geil são boas opções.


Sauvignon Blanc (sovinhon blã) 
Esta uva é cultivada em várias regiões da Europa e do Novo Mundo. Produz um estilo de vinho fresco, pungente, com aromas de vegetais frescos, cítricos e tropicais. Na França, na porção mais ao leste do vale do Loire, origina vinhos minerais, “crocantes” e com aromas de maçã verde e aspargos em denominações como Sancerre, Pouilly-Fumé e Menetou-Salon. Em Bordeaux ela demonstra também um aroma de grama cortada, quando entra nos cortes dos vinhos brancos com a sémillon, resultando em vinhos mais austeros, muitas vezes criados em carvalho. No Chile (San Antonio e Casablanca), bem como em outros terroirs mais quentes, como na Espanha (Rueda, Navarra), atinge aromas mais frutados, cítricos. No país andino estão fazendo boas experiências com carvalho. Na Nova Zelândia o apetitoso sauvignon de Marlborough tem aromas de groselha verde, aspargos e maracujá. Boas dicas são os vinhos de Pascal Jolivet e Joseph Mellot no Loire, vinhos bordaleses da região de Entre-Deux-Mers (alguns, como o Château Chasse Blanc, o Château La Mothe du Barry e o Château de Mirambeau tem alta relação qualidade/preço), o neo-zelandês Vicar’s Choice e os chilenos da Casa Marin e o Amayna Barrel Fermented, para quem faz questão de um toquezinho amadeirado.

Sémillon (semion) 
Esta uva produz vinhos secos na Austrália e na França, na região de Bordeaux, mas é nessa última que ela encontra sua maior expressão nos vinhos doces da região de Sauternes. Nesse lugar, às margens do Gironde, o vinhedo encontrou um clima úmido e nebuloso ideal para a propagação do Botrytis cinerea, a “podridão nobre” que concentra seu teor de açúcar. Colhidos à mão, muitas vezes um a um, esses bagos são vinificados com muito cuidado para produzir um néctar dourado, doce, com aromas de frutas cristalizadas e mel. Os Sauternes top são caríssimos, mas os châteaux Grand Cru costumam produzir também um segundo vinho, de muito boa qualidade e preço melhor, mas encontramos opções menos caras e com ótima qualidade no vilarejo vizinho de Barsac.

Viognier (vionhiê)
Cepa que origina vinhos com aromas inebriantes de damasco, marmelo e mel, muito perfumados, untuosos mas muito bem  equilibrados, principalmente no sul da França, ao norte do vale do Rhône. Quando estive por ali provei ótimos Condrieu, região que cultiva exclusivamente viognier. A Austrália, California, Argentina e Brasil também produzem a viognier, mas não com a mesma expressão que a francesa. No Brasil já provei e indico viogniers franceses de Paul Jaboulet Ainé e Guigal, argentinos de Catena e Luigi Bosca, além do nacional Miolo RAR e Miolo Reserva.

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