Infelizmente vivemos tempos em que o bom senso anda
esquecido e as regras de ouro da boa educação também. São tempos de uma
verborragia incontrolável e de um desrespeito ao ser humano sem precedentes.
Assim, o constrangimento1 anda solto, como se tudo fosse
permitido ou não passasse de mero mal entendido.
No entanto, certas coisas e valores não mudaram com
o passar do tempo, como querem muitos fazer parecer. Caso contrário, não
precisaríamos nos preocupar, por exemplo, com as repercussões sociais do
Bullying ou do Cyberbullying, principalmente nas escolas e no ambiente de
trabalho. Afinal, poderíamos colocar essas questões no rol do “desconforto” ou
“brincadeira de mau gosto”. Mas, não o fazemos porque não há nada de simples ou
trivial nesses comportamentos.
Cada um sente, percebe e reage as emoções e aos
sentimentos de maneira muito particular. Cada um tem a sua própria história que
determina os níveis de sensibilidade com os quais irá lidar com as situações da
vida. E o mundo, na maioria das vezes, é hostil e perverso não oportunizando a
construção de um emocional capaz de responder equilibradamente às situações.
Por isso, é tão fácil ferir, ofender e agredir o outro. Ninguém conhece em
profundidade o fardo de experiências que ele carrega.
Mas, há situações em que não se trata de “pegar pesado” com as emoções
alheias. Simplesmente, aquilo que se faz ou se verbaliza ao outro é de profunda
deselegância ou inapropriado. Nesses casos, graus de intimidade relacional são
insuficientes para absolver alguém de uma má conduta. É o caso de pensar antes
de agir. O viver em sociedade clama essas regras de convivência para que haja
uma coexistência pacífica e harmônica.
Vejamos, por exemplo, o caso das relações entre a
Guerra e o Humor. Desde a Segunda Guerra Mundial que muitos grupos sociais
passaram a reproduzir o seu discurso por meio de charges e caricaturas em
jornais e revistas, as quais menosprezavam e humilhavam aqueles considerados
minorias 2. Mais recentemente, em 2015, o mundo viu
novamente esse movimento por meio dos atentados contra o jornal francês Charlie
Hebdo, por conta de charges que fizeram emergir protestos da comunidade
muçulmana em todo o planeta 3.
Isso acontece porque na essência de quaisquer
palavras ou atitudes existem intenções. Nada é gratuito ou involuntário. Há
sempre um propósito, ainda que inconsciente, imerso naquele comportamento. E
como o discurso é o que medeia às relações sociais, permitindo a inserção
humana neste ou naquele lugar social; é fundamental entender que a língua vai
além de um conjunto de signos e de regras, ela é atravessada por aspectos da
ordem do físico, do sociocultural e do psicológico.
Segundo Eni P. Orlandi (2001) 4, “Problematizar as maneiras de ler, levar
o sujeito falante ou o leitor a se colocarem questões sobre o que produzem e o
que ouvem nas diferentes manifestações da linguagem. Perceber que não podemos
não estar sujeitos à linguagem, a seus equívocos, sua opacidade. Saber que não
há neutralidade nem mesmo no uso mais aparentemente cotidiano dos signos. A
entrada no simbólico é irremediável e permanente: estamos comprometidos com os
sentidos e o político. Não temos como não interpretar. Isso, que é contribuição
da análise do discurso, nos coloca em estado de reflexão [...]”.
É fundamental, portanto, fazer da
comunicação uma experiência de vida, na medida em que se ampliam as
possibilidades de ser e de agir discursivamente no mundo; mas, com a
consciência da responsabilidade que isso representa. Embora, a pós-modernidade
nos acene que podemos “realizar sem limites”, de acordo com a própria
vontade, isso não é de fato uma verdade.
Dizem os chineses que “a palavra é prata, o
silêncio é ouro”. Não brinque com as palavras. Não se perca em discursos vãos.
Não construa abismos. Não fomente o ódio. Não contribua com a ignorância. Não
se faça lembrar pelas palavras mal ditas. Use as palavras como ferramenta de
edificação de um mundo melhor; afinal, é para isso que elas servem!
1 Constrangimento - sm. 1. Ato
de constranger. 2. Situação de quem foi violentado. 3. Pudor
que sente quem foi desrespeitado ou exposto a algo indesejável. 4. Acanhamento.
(FERREIRA, A. B. de H. Mini Aurélio: o dicionário da Língua
Portuguesa. 8.ed. Curitiba: Positivo, 2010. 960p.)
Por: ALESSANDRA LELES ROCHA
Professora, bióloga e escritora
Uberlândia - MG
(Via - Antena Cultural)
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